Câmara do Porto e EPorto persistem em cobranças sem sustentação legal

Segundo o que foi vinculado hoje por órgãos de comunicação social, a Câmara do Porto confirmou que a EPorto – empresa que explora a concessão do estacionamento na via pública na cidade do Porto – “Terá de se munir dos vários pareceres e documentos necessários (junto da Câmara e da ANSR), formar o seu pessoal e cumprir todos os requisitos da lei. A EPorto comunicou já à Câmara do Porto que está a desenvolver o processo e espera ainda este ano estar em condições de exercer, nos termos da lei, essa competência, processo que contudo poderá levar ainda alguns meses”. A própria empresa EPorto certifica que “ainda não cumpre (os requisitos da nova legislação) porque as portarias saíram a semana passada”.

Estas reações surgem na sequência da criticável publicação pelo Ministério da Administração Interna da portaria que regulamenta o decreto-lei nº146/2014 de 9 outubro elaborado pelo governo PSD/CDS e que abre a porta à possibilidade do exercício de funções de fiscalização do estacionamento por funcionários de empresas privadas. O referido decreto-lei no entanto estabelece que “a fiscalização do estacionamento (…) será restrita à aplicação das contraordenações previstas no artigo nº71º do Código da Estrada”.

Assim, cabe alertar para duas contradições em que a Câmara do Porto e a concessionária incorrem:

  1. O reconhecimento pela Câmara do Porto e pela própria EPorto que os funcionários desta empresa privada que fiscalizam o estacionamento não estão devidamente credenciados nem cumprem aquilo que a lei obriga e o facto de isso não impedir a prática de “caça à multa” levada a cabo pela concessionária.

  2. O fundamento legal discutível dos montantes cobrados aos utentes em alegada situação irregular. Ou seja, se o decreto-lei estabelece que a atividade de fiscalização do estacionamento se restringe à aplicação do Código da Estrada, nomeadamente ao seu artigo 71º, cuja receita não reverte para a concessionária, qual a justificação para a autarquia e a concessionária estipularem as designadas “taxas agravadas” que podem ir até 12€, cuja receita reverte em grande parte para a concessionária, constituindo uma verdadeira “multa encapotada”?

A situação é ainda mais grave pelo recurso por parte da concessionária, com conhecimento e acordo da Câmara Municipal, a métodos de cobrança que visam intimidar os automobilistas, enviando cartas ameaçando com processos judiciais.

Esta é aliás a prática da mesma empresa no concelho de Gaia, onde também explora o estacionamento na via pública sob o nome ParqueGil, sem que no entanto sejam conhecidos até ao momento casos em que a empresa tenha levado a melhor em tribunal sobre utentes em alegada infração. Aliás, é legitimo questionar como pode ter validade um “aviso” emitido por um funcionário que reconhecidamente não está credenciado para o exercício de funções de fiscalização.

Da mesma forma que há meses a CDU – Coligação Democrática Unitária reclamou que a recolha dos dados das matrículas fosse interrompida, como se veio a verificar por ordem da Comissão Nacional de Proteção de Dados, a CDU reitera a sua exigência do cumprimento da lei e a correspondente suspensão do exercício de funções de fiscalização pelos agentes da EPorto até que estes se encontrem devidamente habilitados.

A privatização do estacionamento na via pública é um processo que tem vindo a ser notícia pelos piores motivos. Esta medida abrangerá até 2/3 da área do concelho, impondo novos custos para quem vive ou trabalha nas zonas implicadas, ao que acresce ainda uma prática de verdadeira “caça à multa”, de ameaça à privacidade dos utilizadores, que se pretende que sejam obrigados a introduzir os dados da matrícula para poder estacionar, a par com o desrespeito pelas funções dos fiscais municipais.

Transformou-se, como a CDU tem vindo a denunciar desde o primeiro momento, uma ferramenta para uma melhor mobilidade na cidade num simples negócio repleto de contradições e de elementos pouco claros.

Porto, 26 de julho de 2016

A CDU – Coligação Democrática Unitária / Cidade do Porto

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