Assembleia Municipal Extraordinária convocada pelo Grupo Municipal da CDU para debater “O reforço do associativismo no Porto”: Intervenção inicial

Ex.º Senhor Presidente da Assembleia Municipal do Porto
Senhoras e Senhores Deputados Municipais,
Ex.º Senhor Presidente da Câmara Municipal do Porto,
Senhoras e Senhores Vereadores,
Minhas Senhoras e meus Senhores,
O Movimento Associativo Popular, com forte tradição na nossa Cidade, assume um importantíssimo papel na coesão social e no próprio sistema democrático. De facto, nestes momentos em que se procura promover o individualismo e o isolacionismo com a ilusão de vida coletiva baseada nas redes sociais, as coletividades continuam a remar contra a maré, afirmando e demonstrando que é possível as pessoas juntarem-se em torno de objetivos comuns e unirem-se para os concretizar. Num exercício de cidadania que contribui para a identidade de um bairro, de uma freguesia, de um município, de uma região ou de um País. Com base em regras democráticas, com eleições, responsabilização e prestação de contas. Substituindo-se ao Estado, Administração Central e Local, em muitas das suas obrigações, designadamente ao nível cultural, desportivo, recreativo e social.
Foi pelo desenvolvimento de modelos de associação e de solidariedade que os portuenses foram criando soluções para enfrentar e resolver alguns dos problemas que enfrentavam. No vasto e diversificado universo do associativismo portuense, as associações mutualistas, que se formaram a partir do século XIX, foram a forma de solucionar algumas das necessidades sociais básicas nas áreas da assistência médica e do apoio social. Podemos considerar que as associações mutualistas são as mais antigas estruturas associativas do Porto. Baseadas nos princípios de solidariedade, reciprocidade e entreajuda entre seus membros, estas associações são hoje um importante agente de coesão social da cidade, formando uma rede de apoio social e de saúde a muitos milhares de portuenses.
Foi, também, o Movimento Associativo que, na sequência do 25 de Abril, tomou em mãos o exaltante desafio da construção de habitações para os seus Associados, com o decisivo impulso do SAAL – Serviço de Apoio Ambulatório Local. Foi no Porto que este desafio teve uma maior expressão, com a construção de centenas de habitações espalhadas por grande parte da cidade e da autoria de muitos dos mais importantes arquitetos da prestigiada escola de arquitetura do Porto – Bouça, Maceda, S. Vítor, Pego Negro, Vilar, Campo Alegre, Massarelos, Francos, Lapa, Leal, Contumil, Antas.
Naturalmente que o Movimento Associativo mudou ao longo dos anos. Designadamente na componente social, muitas das valências asseguradas pelas coletividades deixaram de ter razão de existir. Não esquecemos que, ainda há poucos anos, muitas eram as coletividades que asseguravam o funcionamento de balneários aos seus associados que não tinham casas de banho próprias nas suas habitações. Ou que proporcionavam salas comuns que funcionavam como extensões de casas que não tinham espaço para acolher o convívio familiar, mas tão só as funções básicas de proporcionar refeições (quando as havia) e tarimba para dormir.
Mas as coletividades mantiveram um papel fundamental nas áreas desportiva, cultural e recreativa, proporcionando aos seus associados não apenas a fruição destas atividades, mas, também, a prática das mesmas, transformando-os em agentes culturais e desportivos. Os tempos diversificaram, também, as preocupações, tendo surgido associações com preocupações ambientais, patrimoniais, juvenis, umas mais efémeras e outras mais perenes, mas sempre representativas de um objetivo comum formalizado numa vontade de transformação social.
Tendo consciência da importância do Movimento Associativo e Popular no Porto, a CDU, desde 2013 que propôs na Câmara a constituição de um Fundo de Apoio ao Associativismo Popular que substituísse a política de atribuição avulsa de apoios (aliás fortemente condicionada a partir da gestão de Rui Rio) e consagrasse um modelo de apoio formal que, para além de apoiar efetivamente o movimento associativo de base, implicasse o reconhecimento e a valorização, por parte da autarquia, do seu real papel na cidade.
Foram anos de propostas sempre rejeitadas pelas maiorias municipais, com argumentos diversificados, mas que não se afastavam da tese de um antigo vereador do PS que, vesgamente, afirmava que o apoio a cada coletividade era um apoio a uma sede do PCP!… Mas, em 2019, e fruto de uma correlação de forças que não tinha conferido maioria na Assembleia Municipal ao Movimento de Rui Moreira, da persistência da CDU e da luta das próprias coletividades, foi possível consagrar o Fundo de Apoio ao Associativismo (não popular, como pretendíamos) mas um Fundo efetivo de apoio às associações.
Fundo esse que funcionou, durante três anos, sob a gestão direta do Município – tendo, nesse período, passado pela pandemia que consequências tão negativas teve para muitas coletividades, praticamente obrigadas a não prosseguirem as suas atividades, por natureza gregárias – e, nos últimos quatro anos, por gestão direta das Juntas de Freguesia. Hoje, e felizmente, não se ouvem vozes, pelo menos audíveis, a considerar que o Fundo de Apoio ao Associativismo não se justifica, nem mesmo por parte daqueles, sucessivamente, rejeitaram a proposta da sua criação.
Mas, para além de ser importante, numa fase de mudança de ciclo político, reafirmar a importância da sua manutenção como instrumento fundamental da política municipal – obtendo, para o efeito, a concordância das diferentes forças políticas -, cremos que importa fazer um balanço da sua aplicação, nos dois modelos que vigoraram até agora.
Não pondo em causa o respeito pela autonomia das Juntas de Freguesia, não podemos esquecer, também, que estas são executoras de um programa municipal cujo regulamento é aprovado pelo Município e que nos compete monitorizar a forma como tem vindo a ser aplicado e introduzir as alterações que melhorem a sua execução.
Dessa análise, bem como do conhecimento que temos sobre a forma como o processo funcionou e dos contactos que estabelecemos com dezenas de Associações – a quem agradecemos a disponibilidade e abertura -, constatamos que, havendo uma efetiva transferência de verbas municipais para inúmeras entidades, o Fundo do Associativismo enfermou de aspetos que podem ser melhorados:
a. As verbas atribuídas ficam aquém das necessidades, como o demonstra o facto de inúmeras coletividades, com projetos pertinentes, ficarem de fora por falta de verbas;
b. A distribuição equitativa de verbas por todas as Juntas de Freguesia não tem em conta a dimensão do movimento associativo em cada freguesia, sendo que há disparidades importantes nessa matéria (como se constata, também, pelas diferenças existentes no número de entidades apoiadas por freguesia);

c. O facto de haver instituições que se candidatam ao Fundo do Associativismo em várias freguesias é suscetível de introduzir fatores de injustiça e mesmo de contorno do espírito subjacente ao Programa;
d. Houve Juntas de Freguesia que, antes, destinavam parte do seu próprio orçamento para apoio ao associativismo e que, passando a gerir o Fundo, deixaram de fazer esse investimento (algo que não acontecia quando o fundo era gerido municipalmente);
e. A carga burocrática excessiva associada à instrução das candidaturas impossibilita várias coletividades – quiçá as mais necessitadas de apoio – de as apresentarem;

f. Cada vez mais há apoios a instituições que, independentemente do seu mérito e da bondade da sua atividade, não correspondem ao associativismo de base, possuindo mesmo, algumas delas, atividades que se podem considerar como comerciais – ou que são financiadas por outros programas, designadamente nacionais;

g. Por norma, e com honrosas exceções, o procedimento inerente à implementação anual do Fundo do Associativismo atrasou-se, nalguns casos irremediavelmente, causando situações de dificuldade às coletividades, muitas vezes obrigadas a adiantar dinheiro para a sua realização (ou vendo-se obrigadas a desistirem da mesma);
Significa isto que o apoio ao Associativismo, designadamente àquele que é comummente designado por “Associativismo Popular”, carece, em primeiro lugar, de uma focalização do Fundo do Associativismo nesse objetivo e, simultaneamente, de outras medidas que ajudem a valorizar estas coletividades, considerando-as como verdadeiro parceiro das políticas municipais de coesão social, de fomento das atividades culturais, desportivas e recreativas, de construção de cidadania.
Sabemos que há outros mecanismos a que as coletividades podem recorrer, designadamente o Orçamento Colaborativo, que diversas associações colaboram com o Município em diversos programas tendo como contrapartida a organização ou participação em eventos e que são prestados diversos apoios em termos logísticos à sua atividade.
Mas o Município tem de fazer mais com o objetivo de conhecer a realidade destas coletividades de base, de acarinhar a sua atividade, de entender as suas dificuldades e anseios.
Nesse sentido apresentamos a proposta de se iniciar, ainda durante este mandato, um levantamento de espaços municipais que possam servir de apoio às coletividades que não têm sede, numa lógica individual ou de espaço partilhado. Bem como de se estudar a constituição de um gabinete municipal de apoio às Coletividades que facilite o tratamento dos diversos assuntos que estas têm de resolver com o Município (apoios logísticos, legalização de processos, designadamente a regularização dos direitos de superfície, a isenção de IMI para obras, etc.).
Propomos, também, que a Assembleia Municipal do Porto, neste início de Legislatura, inste a Assembleia da República a regulamentar a legislação em vigor em matéria de apoio ao associativismo e ao reconhecimento do papel do dirigente associativo, de forma a que a mesma tenha os efeitos práticos positivos que a nortearam.
E, relativamente ao Fundo do Associativismo, o balanço que efetuamos deve ser complementado com informações sobre:
a) o número de candidaturas rejeitadas e as razões para a sua rejeição, os resultados e o impacto que tiveram as atividades apoiadas,
b) o enquadramento que os diversos projetos tiveram nas cinco áreas definidas pelo Município (i: infraestruturas e obras; ii: Coesão Social; iii: Cultura e Animação; iv: Desporto; v: Juventude e Ambiente), verificando se houve, ou não, outras áreas a que as coletividades se candidataram;
c) o CAE das entidades candidatas, bem como do seu escopo e em particular, saber se a atividade das mesmas é suscetível de apoios por parte de outros programas promovidos pela Administração Central;
d) as dificuldades que levam inúmeras associações de base a não apresentarem candidaturas, identificando problemas e eventuais formas de os mesmos poderem ser ultrapassados.
Esta é uma tarefa que se pode iniciar desde já, com o envolvimento das juntas de freguesia e das coletividades, designadamente do seu organismo representativo na cidade – a Associação de Coletividades do Porto. Mas, para ter resultados, importa que, hoje, as forças políticas representadas nesta Assembleia Municipal assumam que, efetivamente, pretendem, no próximo mandato, manter o Fundo de Apoio ao Associativismo. Pela nossa parte, desde já declaramos que é fundamental que o mesmo se mantenha, com reforço de verbas, e melhorado e complementado com o estudo da criação de um financiamento de base plurianual às associações que lhes permitam garantir as condições mínimas de funcionamento suscetíveis de alavancarem atividades e projetos – esses sim financiáveis pelo Fundo do Associativismo.
Ex.º Senhor Presidente da Assembleia Municipal do Porto
Senhoras e Senhores Deputados Municipais,
Ex.º Senhor Presidente da Câmara Municipal do Porto,
Senhoras e Senhores Vereadores,
Minhas Senhora e meus Senhores,
Ao convocarmos esta Assembleia Municipal extraordinária, para além de procurarmos contribuir para o reforço do Associativismo Popular do Porto e para o seu reconhecimento como esteio da organização social da Cidade, procuramos dignificar esta Assembleia Municipal, transformando-a naquilo que também deve ser – o grande fórum de debate da Cidade. Orgulhamo-nos de ser a força política que, desde sempre, utilizou esta prorrogativa legal – e neste mandato esta é a 5ª assembleia que convocámos, depois de já termos debatido, por nossa iniciativa, “O espaço público do Porto: sua reabilitação e revitalização”, a “situação social no Porto e o Acesso à habitação”, “a Mobilidade no Porto” e “A Educação no Porto”. Ficamos felizes que as restantes forças políticas tenham, também, começado a utilizar este mecanismo para suscitar o debate dos temas que consideram relevantes. Sem dúvidas que, deste modo e regra geral, contribuímos para dignificar esta Assembleia Municipal.
Porto, 16 de Junho de 2025
O Grupo Municipal da CDU – Coligação Democrática Unitária
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