Impõem-se esclarecimentos cabais acerca da transação judicial subscrita entre a Câmara do Porto e a empresa SELMINHO Lda

Na última reunião da Câmara Municipal do Porto, o Vereador da CDU – Coligação Democrática Unitária, Pedro Carvalho, teve a oportunidade de abordar uma Transação Judicial subscrita pela Câmara Municipal do Porto e pela empresa SELMINHO, Lda, relativa a um terreno propriedade desta e situado na escarpa da Arrábida, denunciando a ilegitimidade do mesmo.

Infelizmente, e como vem sendo habitual, a coligação que gere os destinos da Câmara (Rui Moreira/CDS/PS a que agora se juntam Vereadores do PSD), preferiu o ruído e a chicana política ao esclarecimento de uma situação que, no mínimo, é estranha e cujo enquadramento não permite a persistência de quaisquer dúvidas.

Assim, dado que essa Transação Judicial tem como pano de fundo o PDM do Porto em processo de revisão, e tendo em conta que a competência última de aprovação do PDM compete à Assembleia Municipal, os Deputados Municipais da CDU não podem deixar de reforçar a necessidade de serem prestados esclarecimentos cabais sobre este processo, até porque algumas intervenções feitas durante a referida reunião da Câmara avolumaram as dúvidas.

Sistematizemos, então, essas dúvidas:

  1. A opção pela elaboração da Transação Judicial não é uma contradição com a posição anterior da Câmara do Porto neste processo?

Efetivamente, as Transações Judiciais, tal como aconteceu no passado, justificam-se quando a Câmara reconhece razão à outra parte ou quando a Câmara, não reconhecendo essa razão, deduz que a probabilidade de o Tribunal decidir a favor da outra parte é elevada, o que justifica um acordo com menores custos para o erário público (dando como contrapartida maior celeridade na decisão).

No caso concreto, e de acordo com a própria Transação Judicial, parece que se aplica a primeira das situações: “durante o processo de alteração do PDM do Porto que ocorreu em 2012, o Réu Município declarou que a pretensão da Autora quanto à classificação do seu terreno (…), podia ser atendida nesse processo de revisão”; e “considerando que, na pendência do atual processo judicial, o Réu Município do Porto reiterou esse mesmo entendimento” (Considerandos da Transação Judicial).

No entanto esta informação é contraditória com o que efetivamente se passou anteriormente, dado que, em 2012, a empresa SELMINHO, em sede de discussão pública da 1ª alteração ao PDM de 2006, apresentou uma reclamação que não foi aceite com base numa análise feita pela DMASU – a então Direção Municipal de Ambiente e Serviços Urbanos. Não aceitação que foi aprovada, em reunião, pelo órgão Câmara Municipal do Porto!

  1. Quem é que, em nome da Câmara, assumiu a posição relatada nos considerandos da Transação Judicial?

Na última reunião de Câmara, o Vereador Correia Fernandes, que tutela desde 2013 o Pelouro do Urbanismo da Câmara, declarou “desconhecer o que quer que seja” sobre o assunto e que “não há compromisso nenhum que tenha chegado ao pelouro e ao Vereador do Urbanismo em sede de PDM”.

É agora do conhecimento público que este Acordo foi subscrito com base numa delegação de competências da Vice-Presidente da Câmara Guilhermina Rego, que era Vereadora no anterior mandato, altura em que votou favoravelmente a rejeição da reclamação efetuada pela empresa SELMINHO.

Fica no entanto por esclarecer se o Presidente da Câmara Rui Moreira conhecia o processo e se em algum momento participou em decisões.

  1. Deveria a Transação Judicial ser submetida à apreciação dos Órgãos Municipais do Porto?

No mandato anterior, o órgão Câmara do Porto, em reunião, com base em pareceres da DMASU, deliberou recusar a reclamação apresentada pela empresa SELMINHO, Lda.

Por maioria de razão, e à semelhança daquilo que aconteceu em outras situações deste foro, a alteração da posição anteriormente assumida pela autarquia deveria ter sido objeto de discussão e decisão no órgão Câmara Municipal.

  1. Qual a razão para a Câmara Municipal do Porto ter decidido, em 2014, subscrever a Transação Judicial com a SELMINHO?

De facto, o Diretor Municipal dos Serviços Jurídicos da Câmara Municipal do Porto afirmou, na reunião de 19 de julho, que essa assinatura, que “não conferiu quaisquer direitos” à SELMINHO, “foi um adiar do problema”.

Dito isto, ficam por esclarecer:

  • Qual a razão para a Câmara subscrever um documento que adia um problema?

  • Porque não deixou simplesmente o processo continuar a correr em Tribunal?

  • Que prejuízos adviriam para a Câmara dessa situação e que levaram a Câmara Municipal a alterar a posição assumida no mandato anterior?

  1. Confere a Transação Judicial direitos construtivos à empresa SELMINHO, Lda?

Objetivamente não confere diretamente esses direitos. Mas a Câmara, “comprometendo-se a diligenciar pela alteração da qualificação do solo do terreno da Autora, seja pela alteração da tipologia da qualificação do solo atualmente prevista, seja pela alteração das regras que conformam a utilização do solo de acordo com a qualificação atualmente prevista” está, objetivamente, a reconhecer a concordância com este princípio (capacidade construtiva do terreno e edificabilidade no local), situação que, em sede de Comissão Arbitral, favorece os interesses da SELMINHO (e nunca da Câmara Municipal do Porto).

  1. Haverá outros Acordos assumidos pela Câmara Municipal que impliquem “diligências” para alterar o PDM?

A identificação deste caso concreto no qual a autarquia se compromete a agir para alterar as normas do PDM, no caso em flagrante contradição com a posição assumida no passado em reunião, sem decisão do órgão Câmara nem tão-pouco sequer consulta ao Vereador do Urbanismo, levanta a questão sobre se este será um caso isolado ou um entre vários.

O facto de até ao momento o Presidente da Câmara não ter ainda reconhecido que estas opções devem necessariamente depender de decisão do órgão Câmara Municipal e o tipo de argumentos justificativos apresentados pelos Vereadores da coligação na última reunião da Câmara adensam preocupações sobre a existência de outras situações semelhantes.

Assim, os Deputados Municipais da CDU, consideram que o assunto não está suficientemente esclarecido e que deve ser levado até às últimas consequências, pelo que irão tomar as seguintes medidas:

  • Pedir a imediata convocação da Comissão de Acompanhamento do PDM, exigindo que sejam prestadas informações sobre todos os compromissos formalmente assumidos pela Câmara Municipal do Porto em matéria de “diligência” de alterações ao PDM;

  • Requerer o fornecimento de:

    • Cópia de todo o processo judicial com a empresa SELMINHO que deu origem à Transação Judicial,

    • Informação elaborada pela DMASU em 2012 e que fundamenta a rejeição da reclamação apresentada pela SELMINHO em sede de discussão pública da 1ª alteração ao PDM de 2006; e

    • Todos os requerimentos apresentados à Câmara Municipal do Porto pela SELMINHO e relacionados com o terreno da Calçada da Arrábida, bem como das respostas dadas aos mesmos pelo Município do Porto.

Por último, os Eleitos Municipais da CDU não podem deixar de transmitir ao Presidente da Câmara Rui Moreira que, num assunto desta natureza em que estão envolvidos os interesses de uma empresa privada com o qual tem ligações familiares, se exigia ainda maior transparência e inatacável fundamentação. Tendo optado pela opacidade, não pode, agora, resguardar-se em torno de uma postura de não intervenção, exigindo-se que dê resposta às questões que legitimamente a CDU coloca. Não o fazer apenas contribuiria para adensar dúvidas sobre um processo que se encontra mal esclarecido.

Porto, 22 de julho de 2016

A CDU – Coligação Democrática Unitária / Cidade do Porto

Participam na conferência de imprensa os eleitos municipais da CDU e dirigentes do PCP Artur Ribeiro e Belmiro Magalhães.

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